segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Padre João Gonçalves:

“O recluso espera sempre 
que a comunidade lhe perdoe”



“O recluso espera sempre que a comunidade lhe perdoe e precisa de se sentir perdoado, para reiniciar nova vida”, sublinhou ao SOLIDARIEDADE o padre João Gonçalves, Coordenador Nacional da Pastoral das Prisões. E na cadeia, espera fundamentalmente que o capelão e os visitadores “o escutem e o respeitem como pessoa”, mas também que “lhe transmitam o sentido da esperança”, ajudando-o a reconciliar-se consigo mesmo e com os outros e dando-lhes, ao mesmo tempo, “tranquilidade e paz”, frisou.

O padre João Gonçalves, pároco da Glória (Sé de Aveiro), tem um longo e rico currículo como capelão do Estabelecimento Prisional Regional de Aveiro, com cerca de 30 anos de serviço. Há pouco mais de um ano, foi nomeado Coordenador Nacional da Pastoral das Prisões pelo ministro da Justiça, mediante proposta da Conferência Episcopal Portuguesa. Com plena consciência das tarefas enormes que o esperam, sabe que tudo será mais fácil se a sociedade der uma ajuda, tanto na prevenção da criminalidade, como na reinserção dos ex-reclusos. 


Neste aliciante cargo, compete-lhe coordenar o trabalho dos 51 assistentes religiosos, de expressão católica, que atuam nos 55 Estabelecimentos Prisionais existentes no País, estudando com eles as medidas necessárias para um cabal desempenho das suas funções. Tem, ainda, de promover ações de formação e de atualização para os mesmos assistentes e assegurar a articulação dos serviços religiosos com a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, sempre em sintonia com os bispos diocesanos.

Sendo certo que dos capelães das cadeias se espera, em especial, o apoio religioso e moral aos que se encontram detidos, a verdade é que não podem ficar alheios aos dramas humanos que cada recluso “carrega” na hora da detenção e mesmo antes. Vítimas, muitas vezes, de uma sociedade injusta, capaz de marginalizar os mais frágeis, os reclusos deixam atrás de si famílias sem apoio económico, famílias desfeitas ou destroçadas e noivados terminados, sublinhou o padre João Gonçalves. 

É verdade que o IRS (Instituto de Reinserção Social) procura estar atento aos dramas e necessidades dos reclusos e seus familiares, prestando alguns apoios e encaminhando os mais carentes para instâncias que possam ajudar. Mas tudo isto não chega, garante o Coordenador Nacional da Pastoral das Prisões, enquanto alerta para a urgência das comunidades paroquiais se organizarem para dar respostas às carências dos seus membros que se encontram detidos, bem como às suas famílias. 

Sublinhando que os detidos são sempre pessoas, “por mais aberrantes que possam parecer os crimes que tenham cometido”, o padre João Gonçalves referiu que o recluso e o ex-recluso “têm de ser tratados com toda a dignidade”, sendo indiscutível que estão fragilizados e a necessitar de muito apoio para se reintegrarem na sociedade. Frisou que das empresas comerciais e industriais se espera uma maior e mais generosa abertura para acolher os que saem das prisões, tendo sempre em conta que, “quanto mais tempo os ex-presos estiverem sem trabalho, mais facilmente podem voltar a cair na marginalidade e no crime”.

O Coordenador Nacional da Pastoral das Prisões enfatizou a importância do contributo das IPSS e dos Centros Paroquiais no trabalho de apoio aos ex-detidos, tendo adiantado que se torna imperioso que todos adiram a Projectos de Família e Comunidade, não se ficando apenas pelos Berçários, Infantários, ATL e Lares, o que já não é pouco. Através daqueles projectos, mediante acordos com a Segurança Social, será possível investir na prevenção das toxicodependências, incluindo o alcoolismo, que são quem mais gente leva à marginalidade, ao crime e às cadeias. E pergunta, com oportunidade: “Será que as paróquias e as suas instituições estão realmente envolvidas nos Planos Municipais de luta contra a toxicodependência e de prevenção do alcoolismo?”

No nosso País, há, presentemente, mais de 13 mil reclusos, sendo 93 por cento homens e sete por cento mulheres. Cerca de metade têm idades compreendidas entre os 25 e os 39 anos de idade e as causas, como é público, são os crimes ligados às drogas. Os presos preventivos constituem mais de 25 por cento da totalidade, estando os restantes a cumprir penas. Também é sabido que os preventivos esperam longos tempos pelos julgamentos, o que, em muitos casos, não deixa de ser dramático para os próprios, presumíveis inocentes, e para as suas famílias.

Os capelães contam com os visitadores das cadeias, os quais prestam um inestimável serviço à comunidade, em geral, e aos reclusos, em particular. Praticamente, todos os Estabelecimentos Prisionais têm grupos de visitadores, devidamente organizados, mas são necessários muitos mais. Segundo nos garantiu o padre João Gonçalves, estes preciosos colaboradores têm de ter vocação e algumas aptidões para este serviço, não podendo deixar de passar por uma formação adequada, para que desempenhem as suas funções com mais eficácia. 

Os visitadores não vão às cadeias só para conversar, referiu o Coordenador Nacional, tendo acrescentado que eles podem fazer “uma montanha de actividades complementares nos serviços de educação, da cultura e do desporto”. Mas também referiu que seria bom que muitos estivessem ligados a IPSS e a Centros Paroquiais, para “protocolarem ações com a Segurança Social, destinadas aos reclusos e seus familiares”. Aliás, “já há exemplos de visitadores das cadeias que se organizaram em IPSS para fazerem um trabalho com mais profundidade e eficiência, mas ainda com mais qualidade”, frisou o padre João Gonçalves. 

Fernando Martins

Publicado no jornal SOLIDARIEDADE


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